PROVÉRBIOS 3,28: "NÃO DIGAS A TEU PRÓXIMO: 'VAI EMBORA! PASSA DEPOIS! AMANHÃ DAR-TE-EI...' E TENS A COISA NA MÃO...."
Se tens um bem que podes dar não o dás, esse benefício torna um malefício para ti. Fica, de fato, em tuas mãos a alimentar o teu egoísmo. Aquilo que reténs sem necessidade acaba por manter-te aprisionado. E isso se torna um vínculo que amarra os teus pensamentos e fecha o teu coração. Tu crês de possuir, mas, de fato, és tu que és possuido. Aquilo que se acumula, ou se corrompe ou te corrompe. Ao contrário, aquilo que dás te melhora. Porque é um ato de altruísmo que faz crescer em ti o amor. E lembra-te que tu és grande quanto é grande a tua capacidade de amar.
Na vida do Espírito, não valem as leis da economia; ao invés, freqüentemente são o contrário: 'Enriquece-te, se dás; e se não dás, te empobrece'. Se pensares bem, podes sempre dar alguma coisa. Mesmo se faltasse disponibilidade material podes sempre dar uma palavra de bondade, uma palavra de encorajamento. Podes demonstrar a tua compreensão e oferecer a tua solidadriedade.
Muitos pensam que a caridade esteja toda no dar o pão aos famintos; a casa aos desabrigados; o trabalho aos desocupados; no vestir os nus; no cuidar dos enfermos; no assistir aos acidentados. É um grave erro. Existem necessidades igualmente urgentes, profundas e, às vezes, desesperadas, também no campo moral.
Nem sempre se bate à tua porta para estender-te a mão, mas tanto mais para abrir-te o coração. Nem sempre nos é pedido dinheiro, mas sempre nos pede fraternidade. Tem gente angustiada que procura alguém com quem desabafar. Tem gente aflita que busca um apoio para não afundar. Tem gente que busca uma voz na sua solidão; que busca um sorriso para não maldizer a vida; que busca uma luz na sua noite; que busca um ânimo no seu desfalecimento. Que busca uma mão para levantar-se; um ombro para apoiar-se.
Não respondas, portanto: 'Não tenho nada para dar'. Estarás mentindo. Há sempre, como vede, algo para se dar. Não responda: 'Passe amanhã!'
Ele terá um amanhã?
E tu, terás?
É hoje que se tem fome. É hoje que se tem sede. É agora que se sente afogado; que se sente sozinho, perdido.
Lembro-me de ter lido que um homem, sem fé e indiferente ao problema religioso, devia passar longos dias num hospital, para uma doença certamente grave. Na longa internação teve tempo e modo de pensar e de enfrentar os grandes interrogativos da existência, mas sem conseguir encontrar sozinho uma resposta aceitável. Teve vontade de falar com
a freira que todo dia passava e perguntava se precisava de alguma coisa; mas não ousou perguntar-lhe porque a freira estava sempre com pressa. Fez uma tímida tentativa com o capelão, mas também este tinha que fazer o seu giro por todos os quartos e tinha, assim, pouco tempo. Curado, deixou o hospital e levou no íntimo aqueles ângulos tanto escuros sobre os quais desejava receber um pouco de luz. Pensou então num crente, seu amigo e esperava que esse viesse ao seu encontro; mas ouviu somente prometer: 'Qualquer dia desse a gente se fala'. Mas um dia, de repente, recaiu na doença... e a morte o levou.
Pedira uma palavra, uma mão, uma luz; mas os que tinham fé tinham-lhe respondido: 'Volta amanhã'.
Não despeça ninguém que bata à tua porta. Se não podes colocar nada na sua mão; poderás sempre oferecer alguma coisa à sua mente, ao seu coração, à sua alma. Não se desculpe dizendo que espiritualmente te sentes mais pobre que ele. Pode ser, sim; mas mesmo assim, podes fazer algo. Podes dispor-te a procurar com ele; podes faze-lo sentir que não está só na sua dor; que em dois, no escuro, surge a coragem.
Não desiluda o próximo que recorre a ti. Talvez se trata do último fio que prende a sua esperança.