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UMA HISTĂRIA REAL SOBRE AMOR, TEMPO E ETERNIDADE
(Fev/2019)
E aĂ, a Ășnica coisa que ela falou foi esperança. E Ă© com essa palavra que eu começo a histĂłria que mudou completamente a minha vida e me trouxe atĂ© aqui. Era junho de 2013, minha namorada terminou comigo um pouco antes dos namorados.
Eu saĂ do carro dela igual um zumbi. E a Ășnica coisa que vinha na minha cabeça era a voz dela dizendo, eu amo vocĂȘ. Cheguei em casa, contei para o meu pai e falei, pai, por que ela terminou comigo, tem amor aqui dentro e eu sei que tem amor dentro dela.
E meu pai falou, meu filho, quando alguém entra na sua vida e depois de um tempo vai embora, pode ser qualquer coisa, menos amor, construa uma nova história. Eu falei, pai, mas como é que começa isso? Ele falou, não se preocupe, todo começo vem de um final. E aquilo bagunçou a minha cabeça, porque eu comecei a lembrar que todos os meus amores começaram porque eu não terminou, eu só entrei no emprego porque a faculdade terminou e deu um loop infinito.
E quando eu estava começando a ficar bem, uma semana depois, meu pai foi diagnosticado com uma doença rara e degenerativa que iria matar em 90 dias. Na hora que a gente recebeu o diagnĂłstico, minha mĂŁe e eu começamos a chorar, xingar tudo, gritar, e meu pai na nossa frente parado, normal, sereno. E eu comecei a xingar meu pai, eu falei, pai, por que vocĂȘ nĂŁo estĂĄ chorando, por que vocĂȘ nĂŁo estĂĄ chorando? E ele falou, olha para mim, meu filho.
E a Ășnica coisa que eu pensava Ă©, como Ă© que eu vou olhar para a pessoa que eu mais amo no mundo, sabendo que ela vai morrer. E eu nĂŁo consegui olhar, e meu pai me segurou, falou, olha para mim. E aĂ eu olhei, e ele falou, se vocĂȘ soubesse que hoje era o Ășltimo dia da sua vida, vocĂȘ ia passar aĂ chorando.
E aĂ eu e minha mĂŁe ficamos parados, e eu falei, pai, vocĂȘ nĂŁo pode morrer. E ele falou, meu filho, todo mundo vai morrer. E eu falei, pai, mas todo mundo vai morrer, e a gente, o que a gente vai fazer? Ele sĂł respondeu, viver.
E foi isso que a gente foi fazer, a gente foi viver. Voltamos a fazer coisas simples, como almoçar juntos, ir ao cinema, e jantar junto. Até que a doença começou a tentar impedir meu pai de viver, e tirou a capacidade dele de falar.
Eu comprei um iPad, entreguei para ele, e ele começou a escrever. Tinha uma pergunta para mim e para minha mãe. Eu peguei o iPad e comecei a escrever.
Entreguei para minha mãe, e a minha mãe começou a escrever. E meu pai começou a chorar, porque ele percebeu que a gente ia viver aquilo com ele. Se ele não falava, a gente não falava, a gente não ia abandonar ele.
Aquessas conversas viraram liçÔes de vida, porque eram conversas sobre o amor, sobre os inĂșmeros foras que eu tomava e continuo tomando, e sobre o amor que ele tinha com a minha mĂŁe. Eu peguei aquelas conversas que viraram textos e publiquei num blog, e viralizou na internet. MilhĂ”es de pessoas liam os textos.
VĂĄrias editoras do paĂs me procuraram para publicar um livro. Eu nem sabia que meu pai escrevia e que o sonho dele era publicar um livro. Cheguei em casa correndo, falei, pai, nĂłs vamos publicar um livro.
E aĂ ele começou a chorar, tremeu e engasgou. Eu corri e chamei a minha mĂŁe, mĂŁe, o papai estĂĄ passando mal, e minha mĂŁe veio correndo. E aĂ eu peguei o iPad e entreguei para ele, e ele escreveu, serĂĄ que vai dar tempo? E aĂ eu saĂ correndo desesperado para a editora e falei, eu nĂŁo quero dinheiro, eu nĂŁo quero nada, eu sĂł quero que o livro saia o mais rĂĄpido possĂvel, para o meu pai poder ver isso.
E eles falaram, vocĂȘ tem todos os textos? Eu falei, tenho. EntĂŁo, me manda agora. Eu voltei para casa correndo, falei, pai, nĂłs temos que mandar os textos agora, vocĂȘ quer alguma coisa? E ele falou, eu quero que o Ășltimo texto seja o meu.
Falei, tĂĄ bom, qual que Ă© o texto? Ele falou, eu acabei de escrever, mas vocĂȘ precisa me prometer uma coisa. Eu falei, o que foi? VocĂȘ sĂł pode ler depois que eu morrer. Eu falei, pai, como assim, pai? E eu falei para ele, tĂĄ bom, pai, entĂŁo vocĂȘ tem que me prometer uma coisa.
E ele escreveu, o que? VocĂȘ nĂŁo pode morrer. E aĂ, eu e meu pai cumprimos a promessa. A gente lançou o nosso livro, Faça Amor, NĂŁo Faça Jogo.
Mais de 400 pessoas no lançamento, eu, meu pai, minha mĂŁe, minha sobrinha. O livro virou best-seller no paĂs. SĂł que aĂ a doença tentou impedir meu pai de viver e tirou a capacidade dele de andar e colocou ele na cadeira de rodas.
E agora a gente tinha rodas, o que a gente tinha que fazer? Meu pai amava viajar. A gente transformou a cadeira num aviĂŁo. E todo dia, pela manhĂŁ, a gente descia para a nossa pista de decolagem, fazia um plano de voo e aĂ eu separei um dia para vocĂȘs.
Eu nĂŁo lembro se esse dia a gente estava para Nova ZelĂąndia, foram muitas viagens. E sempre que a gente terminava, pousava, eu pegava o iPad, entrava no paĂs que a gente estava e a gente ficava vendo as imagens. Estudava a cultura do paĂs e tudo.
Meu pai, hå mais de 30 anos, ia toda sexta-feira com dois irmãos na mesma pizzaria. Ele continuou indo de cadeira de rodas, só que a doença tentou impedir meu pai de viver e tirou a capacidade dele de comer. E aà os irmãos deles, meus tios, começaram a ir lå em casa toda sexta-feira e falaram que a pizzaria não tinha graça sem o meu pai.
E aĂ eles ficavam rindo, dando risada e meu pai começou a chorar quando eles fizeram isso, porque ele viu que os irmĂŁos dele nĂŁo iam abandonar ele e nĂŁo abandonaram. Foram lĂĄ em casa toda sexta-feira atĂ© o Ășltimo dia de vida do meu pai. Meu pai, ele formou a Europreto, Minas Gerais, e ele tinha trĂȘs amigos.
Quando eles formaram, eles combinaram que de cinco em cinco anos eles iam se ver. Naquele ano, meu pai estava muito debilitado e nĂŁo conseguiu ir. Os trĂȘs amigos dele, cada formando, tem uma foto pregada na RepĂșblica.
Os trĂȘs amigos pegaram as fotos dos quatro, pegaram a estrada, chegaram lĂĄ em casa de surpresa, pregaram as fotos no quarto do meu pai e falaram, a nossa RepĂșblica Ă© a sua casa. E meu pai começou a chorar e todo mundo começou a chorar, porque ele viu que os amigos dele nĂŁo iam abandonar e nĂŁo abandonaram. Trocaram cinco em cinco anos para um em um mĂȘs eles iam lĂĄ e faziam a nova festa da RepĂșblica.
No dia 2 de julho de 2015, meus pais completavam 46 anos de casado. Todo aniversårio de casamento, os meus pais faziam isso aqui, eles dançavam. Naquele ano, meu pai não conseguia ficar em pé e aà a minha mãe falou, busca cadeira de rodas.
Eu falei, por quĂȘ mĂŁe, o que vocĂȘ vai fazer? Ela respondeu, eu vou fazer o que seu pai faria por mim. Eu busquei a cadeira de rodas e quando eu voltei para o quarto, a minha mĂŁe estava abraçada com meu pai na cama. Eu cheguei perto para ajudar e ela falou, nĂŁo precisa.
E ela começou a tirar meu pai da cama, fazendo maior força e meu pai nĂŁo tinha força, nĂŁo sei de onde que ele tirou, foi a Ășltima força que eu vi ele fazendo na vida e a minha mĂŁe conseguiu colocar ele na cadeira de rodas. Ela colocou uma mĂșsica e ajoelhou ao lado dele e começou a fazer a cadeira girar e os dois começaram a dançar. Meu pai chorava e ria ao mesmo tempo e foi a cena mais bonita que eu jĂĄ vi na minha vida inteira.
Quando acabou a dança, eu entreguei o iPad para o meu pai e ele escreveu, eu tenho um Ășltimo sonho. E eu perguntei, qual que Ă© pai? Ele escreveu, eu quero ver o mar pela Ășltima vez. Eu falei, entĂŁo a gente vai.
Eu fui muito criticado, muita gente falou que eu era louco, porque eu ia levar uma pessoa que nĂŁo falava, nĂŁo comia, nĂŁo fazia nada para a praia, que nĂŁo ia aproveitar nada. A Ășnica coisa que passava na minha cabeça era, talvez o amor seja isso, fazer loucuras, fazer o improvĂĄvel, o impossĂvel virar possĂvel. E eu separei trĂȘs momentos da viagem para vocĂȘs verem, o inĂcio, o meio e o fim.
Quando a gente voltou da viagem, meu pai estava muito debilitado. Ele pegou o iPad e começou a escrever, meu filho, eu estou sentindo muita dor, a minha mĂŁo treme muito, eu nĂŁo sei atĂ© quando eu vou conseguir escrever, a gente precisa criar uma nova forma de comunicar. Se eu piscar uma vez Ă© sim, duas Ă© nĂŁo e trĂȘs Ă© eu te amo.
No dia 23 de agosto de 2015, meu pai faleceu. Os mĂ©dicos tinham dado 90 dias, meu pai viveu por mais de 1.095. Eu resolvi contar um pouquinho dessa histĂłria aqui, porque eu vejo o mundo distorcendo, complicando demais as coisas. Fique com alguĂ©m que faz isso, que te dĂȘ aquilo.
E todas essas regras e exigĂȘncias sĂŁo criadas pela cabeça. O amor Ă© criado aqui dentro, no coração. O resto todo Ă© ilusĂŁo.
Eu vejo a sociedade exigindo demais status sociais, bens materiais, pedindo que os pais coloquem os filhos nas melhores escolas, nas escolas mais caras, que estudem trĂȘs lĂnguas, que as esposas sejam as melhores amantes, sejam bem-sucedidas. E eu queria dizer para todos vocĂȘs que tudo isso nĂŁo significa nada. A Ășnica coisa que o bem mais valioso que vocĂȘs tĂȘm, podem dar para alguĂ©m que vocĂȘ ama, Ă© o seu tempo.
Aquele tempo que a pessoa deita no seu colo e vocĂȘ fala, vai ficar tudo bem. A pessoa que vocĂȘ ama sĂł precisa que vocĂȘ passe pela confiança, que esteja ao lado dela nas suas escolhas e que, principalmente, dĂȘ a ela esperança. Esse Ă© o meu primeiro pedido.
DĂȘ o seu tempo para a pessoa que vocĂȘ ama. Muita gente acha que Ă© fĂĄcil eu pedir isso, porque acha que a minha relação com o meu pai era perfeita. E nĂŁo existe nada perfeito no mundo.
Eu e meu pai éramos cheios de defeitos, nossos seres humanos somos cheios de defeitos. Quantas vezes meu pai entrou no meu quarto e eu falei, pai, me deixa em paz, estou tocando guitarra. Pai, me deixa em paz, estou jogando videogame.
E sabe o que ele fazia? Ele sorria. Eu tratava ele mal e ele sorria. Ele rebatia minha raiva e minha paciĂȘncia com amor.
E foi isso que ele me ensinou. Quando alguĂ©m que a gente ama nos tratar mal, ao invĂ©s de tratĂĄ-lo mal de volta, dĂȘ o seu amor. Porque o amor Ă© a Ășnica forma capaz de transformar o mundo e as pessoas.
O meu pai me transformou. Ele me salvou. Ele nunca desistiu de mim.
E esse Ă© o meu Ășltimo pedido. Nunca desista da pessoa que vocĂȘ ama. E agora vocĂȘs devem estar querendo saber o que Ă© o amor.
Acreditar. Esse Ă© o meu enigma. A forma mais bonita que eu aprendi para deixar um pouco do meu amor dentro de todos vocĂȘs que estĂŁo aqui.
Fiquem com Deus. Obrigado.
Fim
Fonte: TEDx JoĂŁo Pessoa
(Transcrito por TurboScribe.ai)