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Autor: Michel Quoist
Voz: Walmor Chagas
Segui-me, e eu farei de vós pescadores de homens. Evangelho de Marcos, capítulo 1, versículo 17. Esta tarde, Senhor, estou sozinho.
Na igreja, pouco a pouco, os ruídos se calaram. Foi-se embora toda a gente. E eu voltei para casa, passo a passo, sozinho.
Cruzei com gente que voltava de um passeio. Passei pelo cinema, volitava uma pequena multidão. Vaguei ao longo dos terraços de cafés, onde, cansados, os passeadores tudo faziam para esticar um pouco mais a alegria de viver de um domingo de festa.
Esbarrei nos guris que jogavam bola na calçada. Os garotos, Senhor, os filhos dos outros, não serão nunca os meus. E aqui estou, Senhor, sozinho.
O silêncio me dói, a solidão me oprime. Tenho 35 anos, Senhor. Um corpo feito como os outros corpos.
Braços morsos para o trabalho. Um coração reservado para o amor. Mas tudo isto te dei.
É verdade que de tudo precisavas. Tudo te dei, mas é duro, Senhor. É duro dar o próprio corpo.
Ele queria dar-se a outros. É duro amar toda gente e não possuir ninguém. É duro apertar uma mão sem poder retê-la.
É duro fazer que brote uma afeição, mas para dá-la a ti. É duro nada ser para si mesmo, a fim de ser tudo para eles. É duro ser como os outros, entre os outros e ser um outro.
É duro dar sem cessar, sem procurar receber. É duro ir ao encontro dos outros sem que jamais alguém venha ao nosso encontro. É duro sofrer os pecados dos outros, sem poder recusar, acolhê-los e encarregá-los.
É duro receber os segredos, sem poder compartilhá-los. É duro arrastar os outros sem cessar e nunca poder um instante sequer deixar-se arrastar pelos outros. É duro sustentar os fracos, sem poder apoiar-se sobre um forte.
É duro estar sozinho, sozinho diante de todos. Sozinho diante do mundo, sozinho diante do sofrimento, do pecado, da morte. Não estás só, meu filho.
Estou contigo. Eu sou tu. Eu precisava, na verdade, de uma humanidade a mais para continuar minha encarnação e minha redenção.
Desde toda a eternidade, eu te escolhi. Eu preciso de ti. Preciso de tuas mãos para continuar a abençoar.
Preciso de teus lábios para continuar a falar. Preciso de teu corpo para continuar a sofrer. Preciso de teu coração para continuar a amar.
Preciso de ti para continuar a salvar. Fica comigo, meu filho. Senhor, eis-me aqui.
Eis meu corpo, eis meu coração, eis minha alma. Faz-me bastante grande para atingir o mundo. Bastante forte para carregá-lo.
Bastante puro para abraçá-lo, sem querer guardá-lo. Faz que eu seja um ponto de encontro, sim, mas ponto de passagem. Caminho que não prende para si próprio, porque nele não há nada de humano a encontrar.
Nada que não conduza a ti. Esta tarde, Senhor, enquanto tudo em volta silencia, dentro do meu coração sinto morder duramente a solidão. Enquanto meu coração uiva longamente sua fome de prazer.
Enquanto os homens devoram minha alma, e eu me sinto impotente para saciá-los. Enquanto sobre meus ombros pesa o mundo inteiro, com todo o seu peso de miséria e de pecado, eu te repito, meu, sim. Não as gargalhadas, mas lentamente, lucidamente, humildemente.
Sozinho, Senhor, sob teu olhar, na paz da tarde.
Fim
Fonte: LP gravado por WALMOR CHAGAS - Ele foi um famoso ator, diretor e produtor teatral brasileiro. - com as mensagens do padre e escritor francês é MICHEL QUOIST.
(Transcrito por TurboScribe.ai)